Você sabia que...
Dádiva de Medula Óssea
A dádiva de medula óssea é um
procedimento, que pode ser usado para tratar alguns cancros do sangue
(leucemias e linfomas), anemia aplastica (doença genética em que a medula é
incapaz de produzir as células sanguíneas) e imunodeficiências primárias. Algumas
destas situações clínicas, sem esta abordagem terapêutica, são fatais.
O que é a medula óssea?
A medula óssea é um tecido mole,
gelatinoso que se encontra no interior de todos os ossos e que é responsável
pela produção das células do sangue, os glóbulos vermelhos, os glóbulos brancos
e as plaquetas. Estas células, apesar de serem diferentes no seu aspecto e nas
suas funções, são provenientes de uma mesma célula mãe chamada célula estaminal
hematopoiética (de hemato «sangue» e poiese «criação»).
As células estaminais são células
indiferenciadas que têm a capacidade de se dividirem indefinidamente e que, em
determinada altura, algumas são capazes de se diferenciarem em células com funções
específicas como células musculares, células ósseas ou, como é o caso das
células estaminais localizadas na medula óssea, em glóbulos vermelhos, glóbulos
brancos e plaquetas.
É esta capacidade destas células
que nos últimos anos tem vindo a ser investigada e tem criado uma esperança
para algumas situações. O transplante de células estaminais hematopoiéticas (vulgarmente
designada de transplante de medula) tem constituído nos últimos anos uma esperança
renovada para alguns doentes.
As questões de compatibilidade no
transplante de medula
Os dadores de sangue desde há
muito que estão familiarizados com as questões de compatibilidade entre grupos
sanguíneos. Falar do A+ (pos) ou do 0- (neg) já faz parte da linguagem comum e
aos dadores não é estranho o facto de que os doentes do grupo A não podem
receber sangue do grupo B, por exemplo, e que o grupo 0 Rh negativo é o dador
universal, pode dar a todos.
Nos glóbulos vermelhos, as
questões de compatibilidade entre grupos sanguíneos estão aligeiradas uma vez
que existem 4 grandes grupos (o A, B, AB e o 0) que passarão a 8 se tivermos em
linha de conta o sistema Rh (A+, A-, B+, B-, AB+, AB-, 0+ e 0-).
Nos glóbulos brancos também
existem “grupos sanguíneos”. Acontece que nestas células sanguíneas os antigénios
que determinam estes grupos sanguíneos não são só 8 como nos glóbulos
vermelhos. Os Antigénios dos Leucócitos Humanos (são designados abreviadamente
e na língua inglesa de HLA) apresentam uma variabilidade imensa o que torna, na
maioria das vezes muito difícil de encontrar alguém que tenha um “grupo sanguíneo”
do sistema HLA igual ao do doente que está a necessitar de transplante de
medula.
Uma vez que a variedade é imensa,
antes de se colherem as células estaminais hematopoiéticas para se proceder ao
transplante, deve-se determinar o “grupo sanguíneo” do sistema HLA do candidato
a dador, colocá-lo numa base de dados para que possa ser referenciado como
compatível quando houver um doente a necessitar de um transplante. Como as
dificuldades de compatibilidade são grandes, o registo dos dadores candidatos a
dádiva de medula é partilhado por muitos outros países do mundo (Bone Marrow
Donors Worldwild em www.bmdw.org) para que possa ser mais fácil encontrar
alguém compatível, onde quer que ele esteja. Portugal é, de momento, um dos
países com o maior número de potenciais dadores registados, graças a um forte espírito
de solidariedade e de inter-ajuda que tem nascido de uma forma determinada e
coesa no nosso país.
Como se
dá medula óssea?
Há uma expressão popular que diz
“se não vai Maomé à montanha, vai a montanha a Maomé” e que pode ser aplicado à
colheita de células de medula. De facto uma das hipóteses de colheita é ir
“Maomé à montanha”, ou seja ir diretamente à medula óssea. A colheita é feita
por punção da crista ilíaca (aquele osso que se sente nas ancas e onde o cinto das
calças se apoia), é feita no bloco operatório, sob anestesia e requer um
internamento de 24 horas. A outra hipótese é a de “a montanha ir a Maomé”, ou
seja, fazer com que as células estaminais da medula apareçam no sangue
periférico. Para que isso aconteça é necessário primeiro estimular as células
estaminais através da administração de uma substância chamada factor de
crescimento e depois, quando as células estimuladas começarem a aparecer no
sangue periférico, é necessário colhê-las com o recurso a um aparelho que
seleciona apenas estas células devolvendo o resto dos elementos celulares ao
dador (técnica de colheita chamada aférese).
Juntos salvamos vidas
Até ao ano de 2003 Portugal
dependia quase exclusivamente de dádivas vindas de outros países. Não tínhamos
um número suficiente de dadores para podermos ajudar os nossos doentes.
2003, o caso clínico de uma
doente foi mediatizado. Os meios de comunicação social, o CEDACE e o IPO trouxeram
o problema a público e isso traduziu-se no crescimento exponencial de dadores
inscritos e com tipagem concluída.
De uma situação de dependência do
exterior, Portugal passou a estar nos 10 primeiros países com maior número de
dadores inscritos com tipagem concluída (282.254 dadores em 12/03/2012).
Dos 106 transplantes de medula
óssea realizados em 2011 com dadores inscritos no CEDACE, 27 foram para doentes
nacionais e 79 para doentes internacionais.
O altruísta é aquele que considera a dedicação aos outros como norma
suprema de moralidade.
Luis Negrão
Serviços Centrais
Instituto Português de Sangue e Transplantação, IP
(in, Noticias de cá e lá, Ano 1 nº4 Março 2012)